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Afinal de contas: como lidar com a inexequibilidade de proposta?

A ideia de inexequibilidade de proposta é um grande desafio para todos na licitação: para o licitante, significa o risco de perder mesmo com um preço imbatível; para o pregoeiro, significa ter que recusar uma proposta ótima. Então, como saber, com objetividade, o que é uma proposta inexequível? Como se prevenir desse imponderável?

 

A ideia de inexequibilidade de proposta é um grande desafio para todos na licitação: para o licitante, significa o risco de perder mesmo com um preço imbatível; para o pregoeiro, significa ter que recusar uma proposta ótima. Então, como saber, com objetividade, o que é uma proposta inexequível? Como se prevenir desse imponderável?

A inexequibilidade tem critérios objetivos definidos pela lei para as obras e os serviços de engenharia, apenas – o que significa que para as compras e demais serviços, não há critério matemático legalmente definido. O artigo 48, §1º, da Lei nº 8.666/93 (LLC – Lei de Licitações e Contratos) define que qualquer proposta para obras ou serviços de engenharia com valor inferior a 70% do valor estimado (ou inferior a 70% do resultado da média das propostas superiores a 50% do valor estimado, o que for menor)) será considerada inexequível. Nesse caso, a inexequibilidade dependerá do valor estimado pela administração (que tem que ser bem calculado) e das propostas dos demais concorrentes.

Entretanto, mesmo existindo tão precisa conceituação legal sobre a inexequibilidade para o caso de obras e serviços de engenharia, há relativizações. Temos um exemplo: em um pregão eletrônico de obra, a empresa X ofertou lance bastante mais baixo que as demais (inferior a 70% da média das demais propostas); a empresa Y resolveu cobrir o lance, mesmo levando ao limite sua margem de lucro, porque tinha grande interesse na contratação. No entanto, a empresa X teve seu lance desconsiderado, a pedido, sob a alegação de erro de digitação – com isso, a média das propostas subiu e o lance da empresa Y ficou inferior ao limite de 70%. Como a fase de lances foi encerrada logo a seguir, a empresa Y acabou sendo desclassificada porque seu lance, dentro da média das propostas, mostrou-se inexequível.

Para tentar equilibrar essa disposição, a lei determina, no mesmo artigo 48, II, da LLC, que ao licitante deve ser oferecida a oportunidade de demonstração da viabilidade da proposta, através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado. Portanto, mesmo tratando-se de licitação para obras e serviços de engenharia, os critérios objetivos não podem ser tomados de forma absoluta, sendo necessária uma avaliação casuística.

Já no caso das demais contratações, dois critérios são mencionados pela lei para recusa de uma proposta. O primeiro é o do art.48, II, da LLC, que se refere propriamente a “preços manifestamente inexequíveis” – embora a expressão “manifestamente” seja forte, está longe de ser precisa e objetivamente definida.

O segundo critério, por sua vez, também tem a sua complexidade. Ele decorre do art.44, §3º da LLC, e tem dois parâmetros. O primeiro refere-se a inadmissibilidade de “proposta que apresente preços global ou unitários simbólicos, irrisórios ou de valor zero” – o valor zero é de fácil constatação, mas “simbólicos” e “irrisórios” são menos precisos. O outro é a compatibilidade da proposta ante os preços dos insumos e salários de mercado, acrescidos dos respectivos encargos – ou seja, o valor da proposta tem que ser compatível com o custo do fornecimento, conforme parâmetros de mercado. No entanto, mesmo esse último referencial é relativizado pela lei, que excepciona a consideração dos custos do fornecimento em caso de se referirem a materiais e instalações de propriedade do próprio licitante, para os quais ele renuncie a parcela ou à totalidade da remuneração.

Com isso, como se pode ver, há duas graves dificuldades na apreciação da inexequibilidade de uma proposta: a primeira, é que ela deve ser avaliada a partir de conceitos pouco precisos (irrisório, manifestamente inexequível) e que sempre relativizam os conceitos mais objetivos (compatibilidade da proposta com os preços dos insumos ou, no caso de obras e serviços de engenharia, propostas que não sejam inferiores a 70% do preço estimado ou a 70% da média das propostas superiores a 50% do estimado); a segunda é que há uma grande quantidade de variáveis a serem consideradas e que dependem do casuísmo.

Portanto, embora não exista uma expressão prévia e objetiva do que seja uma proposta inexequível, especialmente porque, via de regra, ela depende de comparação com as demais propostas, é possível organizar as informações e as disposições legais de modo mais racional para lidar com o problema. Assim, é preciso relevar os parâmetros do art.48, §2º, da LLC (para obras e serviços de engenharia) e os do art.48, II, LLC (custos de fornecimento, para as demais contratações). Importa, ainda, lembrar que o preço estimado também é uma variável muito importante e que merece ser objeto de impugnações (ao edital), se for o caso. Por fim, se a conclusão é de que a inexequibilidade depende muito da casuística, então é imprescindível (até porque a lei assim desejou – vide art. 48, II, LLC) que seja garantido o direito de demonstração da viabilidade da proposta antes de qualquer decisão.

(Colaborou Dr. Saulo Stefanone Alle, advogado especializado em licitações e contratos administrativos, no escritório AMP Advogados).

Publicado em 06 de agosto de 2013
*Alguns esclarecimentos foram prestados durante a vigência de determinada legislação e podem tornar-se defasados, em virtude de nova legislação que venha a modificar a anterior, utilizada como fundamento da consulta

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